desemoldurado

além do que se vê, sentimento

Depois da mudança a casa ficou calada, vazia.

O silêncio abafado nas paredes lembra ontem quando houve música.

Lembra os encontros, as conversas, o cheiro das comidas…

Lágrimas rítmicas pingam na pia da cozinha fria.

Mas nos quartos vazios com as janelas fechadas ainda há calor de vida.

Entra uma luz que clareia a marca dos móveis riscada no chão.

Na sala ficou esquecido um retrato velho emoldurado em madeira esculpida por alheios cupins.

Uma moldura frágil que se sustentava pela expectativa de ser outros retratos.

E no silêncio da mudança, um sopro de vento novo norte do novo tempo.

A casa merece um trato,

um novo retrato com uma nova moldura.

Ou talvez, sem moldura.

Pois um retrato sem moldura é abertura.

É janela pra alma puramente infinita, porta aberta pro caminho seguramente incerto.

Certo de constantes mudanças e inconstantes retratos.

Se a moldura é limite estreito, o enquadramento precisa ser grande angular.

E que tal uma moldura sem retrato?

Na moldura vazia há além do que se vê, sentimento.

Espaço cheio de vazio a se preencher, emoção.

Vazio cheio de desafios a se cumprir, responsabilidade.

Moldura solta é muito mais expressão.

É mais personagem do que personalidade.

É liberdade de possibilidades e oportunidades.

Desemoldurado o retrato é livremente experimental.

Pode-se sonhar ao avesso e viver do essencial.

Pode até ser paisagem…

Paisagem sem moldura é feito casa sem muro.

O mundo é o lar, o quintal vai da montanha ao mar.

A cama é de nuvem e a energia é solar.

A família é humanidademente unida.

De repente, na casa vazia habita-se esperança.

Nova paisagem e novo retrato, sem moldura

em tempo de mudança.

bd

~ por altareiabh em 22 de abril de 2010.

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