Foi uma maré

E é numa compulsão que vos escrevo novamente. Nossa, quanta pompa nojenta logo assim, de cara. Desculpem. Tem um tanto de gente que eu não conheço e talvez nem quem conheço seja digno de ouvir o que eu vou dizer agora. Desculpem por isso também. Um tanto de coisas vai sair – se é que eu vá permitir – e não vai ser legal. Talvez pra mim, mas pra vocês definitivamente não vai ser legal. Ainda tá tudo meio travado, meio sonso, mas ao longo da blablação a gente vai criando alguma intimidade. Eu vou chegar até a dizer coisas pra vocês. Não, não pra vocês. É pra mim mesmo, mas que escutem. Ai meu deus, eu não to me aguentando. To chata e quando se está chato parece que nem a escrita flui, nem o que é querer dizerr porque nada é dito assim, com a sua energia trancada, atravancada. Mas calma, eu preciso ter calma e me desculpem por isso também. Porque é preciso que vocês também tenham calma pra me entender. Não. Não vai ser preciso me entender porque muitas vezes me tornarei incompreensível. Mas se os ouvidos estiverem bem abertados, já está de bom grado. Uma introdução débil pra um texto confuso. As vezes eu não me aguento. Cê já sentiu isso, pontadas no cu? Pontadas no cu de tamanha ansiedade. Viu? Eu disse que aos poucos a intimidade ia surgir. Mas não era sobre o cu, nem sobre as pontadas. Era alguma coisa, se bem me lembro, relacionada a minha mãe. Ela gostava muito de dançar e de repente parou. Alguma coisa sobre um tal dia que alguém, alguma pessoa, homem ou mulher, eu realmente não lembro direito, falou pra ela parar de dançar e ela simplesmente parou. Simples assim. Mas também não era isso. Não era sobre a simplicidade que tentatava. Ou era sobre a simplicidade? Era alguma coisa de mim que de tão egoísta me fez abrir o computador só pra escrever pra vocês. Coisas de mim. Ou a antecipação do que aquilo, um dia, se tornaria de mim. Ou que já se tornou há algum tempo, mas não houve muita atenção a respeito. Ou houve muita atenção. Se fosse católica, seria deus. Deus todo. Todo poderoso. Todo cretininho esse deusinho, né? Chega assim todo onipotente e acha que pode dizer que o mundo é dele e só. Fala não pás puta, diz não pos viado. E o que eu faço comigo que sou toda puta e viado? Ô papinho besta esse de falar de Deus. De falar da gente. Podia estar enchendo os seus sacos com a fome e a.. Tá roncando um buraco falando que quer mamar. Tá abrindo um bocão cheio de dentes e vocês não suportam. E é claro porque o hálito tá terrível. Nem eu suporto o meu próprio hálito. Foi muito fogo que pegou e cheira agora a querosene. E não me venha falar que não é físico. Porque quando esse ataque vem – e cada vez tem sido mais frequente – é preciso me encolher toda feito um bebezinho gordinho. Pé de coisiquinha é uma coisinha bonitinha. Dá pra ficar olhando por horas e de repente, só uma coisinha. Um projetinho de vida. Um pontinho de esp. Esperança? Não, não seria essa A palavra. Seria alguma coisa mais ligada a xaninha rosadinha. A xaninha rosadinha engolindo de comprido todos os pauzinhos saltitantes que rodam por essas terras verdes que se chama Amazônia. Dá o meu verdinho aí, mamãezinha. Dá e vem comigo pra gente dançar um bocadinho juntas. Pisa no meu pé e fecha os olhos que eu vou guiando com tamanha agilidade e sensualidade que você vai se sentir como há dez anos atrás. Um pouco mais arrebentada, murcha, mas tem alguma coisa aí que pulsa na mesma intensidade ou mais. Eu quero ver os seus olhos espurgando toda a dor e felicidasde de sonhos de outrora. Quero ver seus pézinhos um tanto secos e cascudos dando voltinhas na pontinha dos pés. Me dá um abraço forte, apertado de quem ainda não parou de sentir. Me mostra mais do que esse arrastar gelado dos seus pés nesse chão sujo de areia e baba de cachorro. Mãezinha, tira a sua mão do cachorro e me faz um carinho lento na cabeça que hoje eu tô me sentindo tão só – pozinho. Vem com as pulgas, vem com a raiva e a força de quem quer me dar umas bofetadas há anos. Me dá um tonga, mãe. Adelante. Como eu te beijo, como eu te adoço todos os dias. De pouquinho em pouquinho. E tu, filho? Achou que eu não ia falar.. Cê teima em dizer “vocês lembram?” e no entanto só há eu e mais ninguém. É a minha presença dual, dupla, põe mais dois aí ou a ausência completa dela? Dá três bombadinha no cu, pega o seu colene e passa no cabelo chupado de tanta química, se olha no espelho e sai! Vivo, altivo, transpirando beleza. Você não é homem pra se sentir sujo depois de três bombadinhas no cu.  Olha no fundo da curva do meu olho e me dá seu ouvido. Vai virando assim, devagarinho, e me deixa entupi-los dessas coisas que um dia chamei de poesia e que hoje não chamo. Pelo menos isso. Menos pretenção. Sai desse corpo, minha filha. Sai dele e vai pousando em colos indevidos, pernas mal vividas e pênis roliços. Nem eu me aguento. Cruzes. Hoje era um dia de eu estar com você, do seu lado falando que tá tudo bem. Ei já passou, viu filho? Mas hoje eu me sinto tão só que seria uma afronta ficar só a dois. Cê me entende né? Não, não diz que não. Cala. Cala e vê se me ajuda a parar de falar que esse tal de buraco já deu play na música chata. Sempre a mesma batida. Tum tum tum tá. Mas o incompreensível é que minhas dores sempre mudam de batida. E algumas, de tão surpreendentes, me tiram o ar. E não me venha falar que não é físico. Se desse pra organizar eu falaria da falta que me faz. Não você. Não, não, não. Foram 34 nãos e um sim. Mãos. Ô mão gelada da porra. A respiração também tá gelada e fria, você puxou o sorriso. O meu, ficou no lábio um pouquinho puxado pra cima. Ô jeito tonto esse de rir. So-rrir. Coisa mais amarela. Coisa mais doente. Solar. Mais temprano. Ô corzinha doida essa que me invade em sonhos, faz cócegas e depois vai correndo por aí. De casa em casa, só pra me deixar mais irritada de tanto ciume. Hoje eu senti tanta raiva. Chorei tanto. Taquei tudo com tanta intensidade que… Passou. Aperta delete aí e vai selecionando tudo. Não, nem era tão forte assim.


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